terça-feira, 27 de setembro de 2011

Crônica de um aniversariante...

Bicicleta Merckswiss, ano...Século passado!

por Simão Pedro


Eu vi um menino correndo, eu vi o tempo... A canção aviva em minha mente flashes de um passado distante que despertam lembranças muito presentes. Como não lembrar do tempo em que se tinha tempo.
Eu vi o menino correndo, eu vivi esse tempo. Vi o menino brincando e pulando nos galhos finos da velha goiabeira. Vi o menino correndo atrás do palhaço das pernas de pau, o vi junto a ele cantando: “Olha a negra na janela, olha a cara dela”. Eu vi esse menino subindo na carroça desenfreada do Paulão, que gritava como um louco, transportando carne pro mercado. Eu vi esse menino correr assustado quando era surpreendido no alto da torre da igreja pelo Padre Benedito; vi o menino descer apressado as escadas, com medo do coque certeiro quando o Padre o alcançava. Eu vi esse menino correr com medo da Laura doida, quando ela passava rondando a sua casa. Eu vi o menino correr ao sair da escola, com medo de apanhar, porque no recreio o colega dizia: “Lá fora vou te pegar”. Eu vi o menino correr pelas ruas, quando terminava a chuva, via esse menino colocando sobre a correnteza, barquinhos de papel que desciam em direção a baixa. Eu vi o menino sair em disparada rumo ao bar do Seu Décio, pra tomar uma farinha Nestlé, quando conseguia alguma moeda. Eu vi esse menino correndo com medo de ser carimbado na brincadeira do pau seco. Eu vi o menino correndo pro rumo de casa quando a turma da baixa rondava o beco que ele morava. Eu vi o menino correndo quando era flagrado no comércio do Dico Cearense, com a boca cheia de açúcar e farinha. Eu vi o menino correr pra cantina da Maroca, quando o “Zé Câindo” batia o sino na hora do recreio. Eu vi um menino correndo pro rumo da Petisqueira pra ganhar bombom pipper e tomar guaraná champanhe; via esse menino sair correndo da Petisqueira levando os recados para as moças que estavam  na praça aguardando a hora do encontro. Eu vi esse menino correndo em sua bicicleta Merckswiss, azul caixão de anjo, levando um grande
tombo ao se exibir na Praça Bona Primo. 

"Simãos" se empanturrando de cuscuz de arroz na praça de alimentação do mercado novo.

Vi esse menino na bodega do  Antônio da Paz, ganhando bombom de rapadura das mãos do “Brigadeiro”. Eu vi esse menino todo encharcado ao cair no fosso do painel do boi em pleno domingo à tarde. Eu vi esse menino assaltando a sacristia da igreja com as mãos, a boca e os bolsos cheios de hóstia. Eu vi esse menino pedindo a bênção a tia Briolanja e osculando suas frágeis mãos; eu o vi também saindo da casa da tia com as mãos cheias de bolo, agradado pela Maria José. Eu vi esse menino galopar sobre os cavalos “sem dono”, amarrados embaixo dos oitizeiros. Eu vi esse menino tremendo de medo no corredor do Sandu, esperando a hora de ser remendado pela Ducarmo. Eu vi esse menino assistindo ao Show do Coronel Ludugero, na primeira fila do teatro do lado da sua família. Eu vi esse menino passeando de lambreta, ao final do dia, com seu pai; via os dois percorrendo os campos cobertos de perpétuas deslizando suavemente por entre os carnaubais em direção a serra.  Eu vi esse menino sentado no balcão de uma farmácia ouvindo conversas de gente grande, pulando de colo em colo, fazendo graça e ganhando algumas moedas. Eu vi esse menino assistindo no rádio o programa da vovó nas noites de domingo. Eu vi esse menino jogando peteca no quintal do Nonato Vasconcelos. Eu vi esse menino banhando no açude grande; vi também ele voltar pra casa muito triste, pois sabia que a taca lhe esperava em casa. Eu vi esse menino saindo zangado do Seu Elesbão, quando ele cortava seu cabelo à moda alemã; o pobre menino sabia que ia ser alvo das velhas e doloridas caçoletas, pois tinha enormes orelhas. Eu vi esse menino dançando nas tertúlias do Campo Maior Clube. Eu vi esse menino correndo sem direção, em busca de um tempo que o próprio tempo deixou para trás. Eu vejo agora o tempo correndo atrás daquele que já foi um menino, e ele correndo em busca das lembranças que o tempo não apagou ainda. Hoje vejo cabelos brancos na fronte desse menino, vejo em seu rosto as marcas do tempo, mas vejo também sua alegria por ter vivido tanto. Por tudo isso uma força estranha me leva a escrever, a contar o que foi visto e vivido ao longo desse tempo. Lembranças que compartilho, que me dão a certeza que vivi cada momento, como se fosse o último.


NOTA DO BITOROCARA - Senhores(as), o Blogger  mexeu de novo na configuração de postagens, por estes dias, teremos um  novo e sofrível aprendizado. Já sei! "Toda mudança é traumática"...   



16 comentários:

WASHINGTON ARAÚJO disse...

Simão, parabéns pelo aniversário e pela bela crônica. Acho que muitos também se viram naquele menino.
Um abraço!

Luis Augusto da Paz disse...

Na maior parte dessas visões, este menino sou eu.

Júnior Araújo disse...

Indea, voce não imagina a viagem que eu fiz no tempo lendo essa crônica.
Parabéns meu amigo.

Horácio Lima disse...

Não conheço pessoalmente o caro Simão Pedro, este ano já fui por duas vezes a Campo Maior, e, talvez pela correria não pude cumprimentá-lo, sou um admirador das suas crônicas.

Hoje em dia devido ao mundo da internet e os avanços tecnológicos é raro vermos as crianças brincarem na rua, se divertindo com coisas simples e prazerosas.

Muito aplausível essa sua história caro aniversariante, muito bom lembrar disso tudo, pois hoje as coisas estão muito diferentes.

Parabéns por essa viagem emocionante.


sp, 28 de setembro de 2011

Simão Pedro disse...

E agora, josé?
A festa acabou,
A luz apagou,
O povo sumiu,
A noite esfriou,
E agora, josé?
Essa música do Paulinho da Viola nos leva a refletir sobre esse momento. A Festa esperada por um ano, passa de repente e você se pergunta: Por que não viver isso o ano inteiro? Já pensou ? Receber tanta coisa boa todos os dias; poder doar aos outros tantas alegrias. Imaginando aqui, a reciprocidade das ações entre os amigos, como seria maravilhoso se as coisas fossem assim.
Recebi uma overdose de manifestações pelo meu aniversário, isso me deixou muito feliz . Eu me senti poderoso, não pelo poder em si , da forma que o mundo enxerga , mas pelo amor que os amigos sentem por mim. Pela conquista que eu realizei nos corações afins, eu me sinto poderoso e forte; por isso, essa força estranha me move.
Sou um homem feliz, tenho feito conquistas e adquirido tesouros intocáveis pelas mãos humanas. Não vivi o bastante, mas já vivi coisas suficientes pra poder afirmar que sou feliz com o que tenho. Deus, sabendo da minha necessidade, permitiu que eu mergulhasse no mundo mais uma vez , no seio de uma família tão digna e generosa, pra receber dela o exemplo.
Por acréscimo de bondade, Deus permitiu que eu formasse a minha família,"minha esposa", "meus filhos", almas algemadas pelo compromisso do amor.
Pra coroar tudo isso, Deus me deu essa multidão de amigos, sentinelas de luz em minha vida.
Por tudo isso, obrigado, simplesmente, obrigado!

Bruna Costa Araújo disse...

Olá, meu nome é Bruna e sou bisneta do Cel. Antônio da Costa Araújo e de Jovelina Alves de Araújo, fiquei muito emocionada ao ver a postagem no blog sobre a história da nossa família. A Mãe Jove (Jovelina Alves de Araújo) está viva e mora com meus pais em Teresina, eu ,atualmente, estou morando em Porto Alegre. Seria de grande prazer ter contato com pessoas que pertenceram a família e conheceram a história do meu bisavô.
Meu email é engbrca@yahoo.com.br , fico aguardando o contato de vocês.
Estou muito feliz de tê-los encontrado.

Simão Pedro disse...

Bruna tenho uma dúvida, seu Bisavô era o Cel. Antonio da Costa Araújo ou era o Coronel Antônio da Costa Araújo Filho? O primeiro( pai) casou duas vezes. No primeiro casamento com Angélica Teixeira e no segundo com Engrácia da Costa Araújo, mãe do segundo. Você confirma?

Josias Bona disse...

NETO, Sucesso total da RÁDIO BITOROCARA, falta colocar as belas musica DOS INCRÍVEIS.

Nonatinho disse...

Grande Simão, peço ao nosso todo poderoso e nosso glorioso Santo Antonio que lhe der milhões de felicidade e muitos anos de vida juntamento com toda sua família, para que voce sempre nos der o prazer de ler as suas bela crônicas.
Meu irmão um forte abraço Nonatinho

José Miranda Filho disse...

Como todos falam, a bicicleta, em Campo Maior, é com efeito o meio de transporte - e de lazer - utilizado por todos: crianças, jovens, velhos, homens, mulheres... Na minha adolescência, verdadeira riqueza. Na juventude, a "volta olímpica" do Açude Grande - o "Lago" -, nos fins de tarde, tornou-se rotina. Muito magro, tinha boa resistência física para pedalar. Pernas compridas: facilidade com os pedais e melhor proteção nos desequilíbrios que resultavam em quedas. A propósito, a maneira como aprendi a andar de bicicleta foi muito estranha, suponho que única, pelo menos no nosso meio. Reconhecendo ser mesmo excêntrico - isto é mais peculiaridade de artistas, de intelectuais, de gênios, em que me qualifico como sobremodo distante de ser -, mas, mesmo assim, sendo um excêntrico, por sinal em tudo que fiz e senti, inclusive nos sentimentos mais nobres e intimamente profundos, realizei meu aprendizado de bicibleta não usando a sela, como é habitual, natural, porém a garupa. O receio de cair, nas primeiras "aulas", além de braços e pernas longos, - o "Esqueleto" e o "Caneludo" -, me proporcionaram uma ideia original: sentado na garupa, alcançaria facilmente o guidon e os pedais. Com esse método, me "habilitei" e adquiri minha "carteira de ciclista". Foi uma alegria!

Horácio Lima disse...

Bicicleta é uma alternativa de um transporte rápido e preserva o meio ambiente. Lembro que os amigos Zé Miranda, Zan e o Sr.inquieto Octacilio Eulálio desembarcavam com as suas "magrelas" ali na José Paulino, sede do Jornal A Luta. A última vez que pedalei uma bicicleta amanheci arrebentado, ou seja, estava enferrujado mesmo.


são paulo, 04 de outubro de 2011

José Miranda Filho disse...

Ô Horácio, não me fale, que me dá saudades. A Luta e a bicicleta, a Rádio Clube e a bicicleta, O São Luís e o São José e a bicicleta, o Açude Grande e a bicicleta... Eu acompanhei o Octacílio em cada aventura ciclística...! E olhe que com a maior desenvoltura. Idade e falta de prática, de exercício, resulta nisso aí: sensação clara de enferrujamento. Aconteceu comigo também uma vez. Quase desfaleci no meio do caminho. E nunca mais experimente novamente.

José Miranda Filho disse...

Eu gostaria de ver a resposta da Bruna Costa Araújo sobre uma dúvida levantada pelo Simão Pedro, em comentário ali em cima. Conforme ela disse, descende da segunda mulher do Cel. Antônio da Costa Araújo Filho: Dona Jovelina Alves de Araújo, com quem ele teve dois filhos: Antônio e Áurea. Dona Jovelina, ainda viva, mora com um deles em Teresina. Resta saber de quem destes vem a Bruna. Ou talvez já de um filho de um deles, isto é, do Antônio ou da Áurea, para que a dúvida do Simão se dissipe (se é que ele tem mesmo interesse nesta história); se é a Bruna bisneta do Cel. Antônio da Costa Araújo ou do Cel. Antônio da Costa Araújo Filho. Confesso que minha ligação é mais com relação ao primeiro casamento do Costa Araújo Filho: Dona Clotilde Rosa da Paz.
Outro descendente da Dona Jovelina, que se manifestou no post contendo a biografia do Coronel, foi Wehrner Costa Araújo: seu neto, filho do Antônio.
Assim, Bruna, volte a dizer alguma coisa a respeito do assunto; é sempre bom a gente se relacionar com novos familiares. Você também, Wehrner.
Quanto ao comentário do Simão Pedro, eu gostaria de dizer que ele pôde ter cometido um pequeno engano na citação do nome da primeira mulher do Cel. Antônio (aquele, pai do Cel. Antônio Filho). Pelo que sei, é Angélica Borges de Lemos (a menos que haja um Teixeira aí metido, mas que não é do meu conhecimento). Se o Simão me pudesse - agora é minha vez - tirar esta dúvida...

Simão Pedro disse...

Caro Zé Miranda,a esposa do Cel. chamava-se Angélica Teixeira da Costa Araujo,segundo minhas anotações,melhor dizendo anotações do meu pai.Quem sabe se o Borges de Lemos não seria seu sobrenome de solteira? Mas valeu sua lembrança, se eu tivesse tempo e você, iríamos depois escrafunchar os livros de cartório ou da casa paroquial.Tenho uma vontade enorme de mergulhar nesses arquivos, registrar a memória das famílias da nossa terra para que isso não se perca com o tempo. Outro desejo que tenho é catalogar os registros nas tumbas do cemitério velho, ali tem muita história perdida que merecia ser guardada.Um dia ainda faço isso.Um abraço e obrigado pelo seu comentário.

José Miranda Filho disse...

Muito obrigado pela atenção, meu prezado Simão.
Acerca do nome da esposa do Cel. Antônio da Costa Araújo (pai do Costa Araújo Filho), volto a me dirigir a você. Tendo consultado uns parentes, estes me disseram desconhecer o sobrenome Teixeira da Angélica. Alguém me informou, inclusive com uma cópia da certidão de casamento dos meus avós (paternos) em mãos. E fui, até, lembrado de que se acha no livro do Reginaldo Gonçalves de Lima, intitulado "Geração Campo Maior - Anotações para uma Enciclopédica" (no qual se veem muitos trabalhos de seu pai, estimado Irmão Turuka) tal documento. É das núpcias de Luiz Rodrigues de Miranda e Úrsula da Costa Araújo, estando ali dito: "filha legítima do Tenente Coronel Antonio da Costa Araújo e Dona Angélica Borges de Lemos". Você, oportunamente, levantou a hipótese de se tratar do nome de solteira. Mas indago: como isso pode ser, se, por ocasião do casamento da filha, Angélica, obviamente, já era mulher do Costa Araújo? O mais provável, então, é que o Teixeira tenha sido usado quando era solteira, retirando-o ao casar, no sentido de reduzir o novo nome. Muitas mulheres procedem assim. Desse modo, se chamava Angélica Teixeira Borges de Lemos, passando a se chamar Angélica Borges de Lemos Costa Araújo (este, inclusive, não mencionado na certidão de casamento do casal acima citado). A dúvida persiste. Quem poderia elucidar para mim seriam meus antigos, porém já todos falecidos. E os mais "jovens" (como este sexagenário), não nos sentimos em perfeitas condições de fazê-lo. Poderei, até, prosseguir com a pesquisa, porque a curiosidade agora é minha.
Louvo sua simpática ideia de realizar o trabalho de pesquisa sobre famílias campomaiorenses. A atividade de genealogista é bastante difícil, mas bela. Vá em frente, que espero estar vivo para ver o resultado. Avante, sem se perturbar com a zoada dos mesquinhos contumazes em debochar, desrespeitar, denegrir, improperar as famílias bem conceituadas de nossa cidade. São pessoas impiedosas; contudo, por isso mesmo, merecedoras de piedade.

Bruna Costa Araújo disse...

Meu bisavô era o Antônio da Costa Araújo Filho. Eu não sei o nome da primeira esposa dele, porque foi o lado da família que não conheci, mas meus pai conheceu seus filhos, tios do mesmo. Ainda cheguei a conhecer a Angélica, a única filha que está viva do general. O segundo casamento foi com a Jovelina Alves de Araújo.

email: engbrca@yahoo.com.br

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